O reencontro: porque sim, o Flamengo já enfrentou o Chelsea
- Igor Schulenburg

- Jun 20
- 5 min read

Uma história esquecida de 1998
Enquanto toda a Nação Rubro-Negra se prepara para o duelo histórico contra o Chelsea no Mundial de Clubes, poucos sabem que este não é o primeiro encontro entre os dois gigantes. Em 5 de agosto de 1998, há quase 27 anos, Flamengo e Chelsea já haviam se enfrentado em solo europeu - e o resultado foi um pesadelo que o torcedor flamenguista prefere esquecer.
O ano de 1998 encontrava o Flamengo em uma das piores crises de sua história. O clube estava mergulhado em problemas financeiros que remontavam ao início da década de 1990, com irregularidades em operações cambiais que posteriormente resultariam em multas milionárias. A situação era tão grave que o Banco Central posteriormente cobraria cerca de R$ 85 milhões corrigidos por irregularidades no registro de valores de negociações internacionais realizadas justamente neste período.
Desde 1993, após o título brasileiro de 1992, o Flamengo havia entrado em uma crise financeira profunda que tornaria as conquistas cada vez mais raras. O clube já mostrava sinais da espiral descendente que o levaria, anos depois, a se tornar o time mais endividado do país.
O cenário político interno
Politicamente, o Flamengo vivia sob a presidência de Kléber Leite (1995-1998), que havia assumido no ano do centenário do clube com grandes promessas. Foi Leite quem trouxe Romário do Barcelona em 1995, mas sua gestão seria marcada por decisões polêmicas e resultados decepcionantes.
Uma das atitudes mais controversas de sua gestão aconteceu em setembro de 1998, quando prometeu devolver o dinheiro do ingresso caso o Flamengo perdesse para a Portuguesa. Com mais de 52 mil pessoas no Maracanã, o time perdeu por 3 a 2 e Kléber teve que honrar a promessa, gerando prejuízo ao clube.
A temporada começou com expectativas altíssimas. Kléber Leite havia montado o que ficou conhecido como "SeleFla" - um elenco recheado de estrelas da Seleção Brasileira, incluindo Romário, que havia retornado definitivamente ao clube. O time contava ainda com Clemer, Junior Baiano, Luiz Alberto, Juan, Cleisson, Zé Roberto, Rodrigo Fabri e Palhinha.
Inicialmente comandado por Paulo Autuori, o projeto começou a desmoronar rapidamente. Autuori, que havia conquistado a América pelo Cruzeiro, não conseguiu implantar sua filosofia no Flamengo e pediu demissão em março, após apenas dois meses, declarando: "Ser técnico do Flamengo dá prestígio e status. Só que para mim isso não funciona".
A era Joel Santana

Com a saída de Autuori, assumiu Joel Santana, técnico com perfil completamente diferente. A mudança desagradou alguns jogadores, incluindo Palhinha, que considerou a ida ao Flamengo "o maior erro de sua carreira" e pediu para ser negociado. A temporada de 1998 foi um fracasso completo. No Campeonato Brasileiro, o Flamengo terminou apenas na 11ª posição, com 9 vitórias, 6 empates e 8 derrotas. A equipe chegou a ficar nove partidas sem vencer e brigou contra o rebaixamento. No Campeonato Carioca, perdeu o título para o Vasco, que ainda por cima comemorou a conquista da Libertadores fazendo festa no clássico contra o Flamengo. Foi eliminado nas oitavas da Copa do Brasil pelo Vitória com uma goleada de 5 a 0.
O Torneio de Amsterdam: por que o confronto aconteceu
A competição na Holanda
O confronto entre Flamengo e Chelsea aconteceu durante o Torneio de Amsterdam (também conhecido como Torneio de Gelderland), uma competição amistosa de pré-temporada realizada na Holanda. O torneio era uma competição tradicional que acontecia anualmente desde 1975.
O jogo não foi uma final, mas sim a disputa pelo terceiro lugar. Tanto Flamengo quanto Chelsea haviam sido eliminados das semifinais - o Mengão perdeu nos pênaltis para o Vitesse, enquanto os Blues também não conseguiram chegar à decisão. Times reservas em campo
Por se tratar de uma disputa pelo terceiro lugar em torneio amistoso, ambas as equipes entraram com formações mistas, mesclando titulares e reservas. O próprio técnico do Chelsea, Gianluca Vialli, atuou como jogador nesta partida - uma curiosidade que mostra o caráter experimental do confronto.
Joel Santana escalou o Flamengo com: Júlio César; Fabiano, Juan, Luiz Alberto e Pimentel; Jamir, Sandro Fonseca (Beto), Iranildo e Vágner (Marcos Assunção); Vinícius (Nélio) e Romário. A equipe tinha uma mistura de jovens promessas como Júlio César e Juan, além da estrela máxima Romário.
Do lado inglês, Gianluca Vialli comandava e jogava simultaneamente. O Chelsea era campeão da Recopa Europeia e da Supercopa da UEFA, mas ainda não tinha os investimentos milionários que o caracterizariam décadas depois. O time contava com jogadores como Gianfranco Zola, Dan Petrescu, Roberto Di Matteo e Gustavo Poyet.
O massacre: 5 a 0 para o Chelsea
O resultado foi um verdadeiro vexame. O Chelsea aplicou uma goleada histórica de 5 a 0 no Flamengo, no estádio GelreDome, em Arnhem, diante de 49.500 espectadores.
Os gols foram marcados por:
Vialli (14' do 1º tempo) - o técnico-jogador abrindo o placar
Petrescu (35' do 1º tempo) - 2 a 0
Petrescu (30' do 2º tempo) - 3 a 0
Poyet (41' do 2º tempo) - 4 a 0
Di Matteo (44' do 2º tempo) - 5 a 0
Para completar a tarde de pesadelo, o lateral Pimentel ainda foi expulso durante a partida, deixando o Flamengo com um jogador a menos e tornando a situação ainda mais constrangedora. O resultado do Flamengo contra o Chelsea em 1998 refletia um momento difícil do futebol brasileiro como um todo. Os clubes enfrentavam sérias dificuldades financeiras, gestões amadoras e falta de profissionalização, enquanto o futebol europeu já começava sua moderna transformação.
Romário fora da Copa de 1998
O contexto se tornava ainda mais dramático pelo fato de Romário, maior estrela do Flamengo, ter sido cortado da Seleção Brasileira para a Copa do Mundo da França. O atacante, que havia sido decisivo no tetra de 1994, vivia um momento de ostracismo na Seleção, o que tornava sua permanência no Flamengo ainda mais frustrante.
Aquele 5 a 0 era um prenúncio dos tempos difíceis que viriam. O Flamengo entraria nos anos 2000 com dívidas colossais, brigas contra o rebaixamento e uma das piores crises de sua história. A situação só começaria a se reverter mais de uma década depois, com a chegada de Eduardo Bandeira de Mello em 2013.
O reencontro de 2025: a roda virou
Hoje, 27 anos depois, Flamengo e Chelsea se reencontram em circunstâncias completamente diferentes. O Mengão vive sua melhor fase moderna, com estrutura profissional, estabilidade financeira e títulos continentais. Os Blues, por sua vez, passaram por uma revolução com investimentos bilionários e se tornaram potência mundial.
O confronto no Mundial de Clubes de 2025 representa não apenas um duelo entre dois gigantes, mas também a oportunidade de redenção para uma geração de torcedores que sequer sabe que esse jogo de 1998 aconteceu. Uma história que merecia ser contada, para que a Nação entenda que, às vezes, é preciso perder para aprender a vencer. E disso, historicamente, a gente sabe bem.




















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